segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Fernão Lopes: historiador e prosador, Artigo publicado em março no Caderno de Língua e Literatura das Faculdades Integradas de Ribeirão Pires

Fernão Lopes: historiador e prosador

Ironicamente pouco se sabe sobre a biografia do grande historiador português Fernão Lopes, o qual se firma também como maior personalidade literária da Idade Média. Presume-se que nasceu entre 1380 e 1390, em Lisboa, e morreu por volta de 1460. Foi momeado guarda-mor da Torre do Tombo em 1418 ( marco inicial do Humanismo português) por D. Duarte, antes disto já havia sido escrivão dos livros de D. João I, em 1422 serviu de secretário,”escrivão da puridade”de D. Fernando. Em 1434 foi incumbido de escrever as crônicas dos antigos reis de Portugal, das quais nos chegaram apenas três: Crônica de El- Rei D. Pedro, Crônica de El- Rei D. Fernando e a inacabada Crônica de El- Rei D. João.

Fernão Lopes é considerado um historiador sério e metódico, que procurou transcrever a verdade dos fatos, utilizando-se de todo material informativo que tinha a seu alcance, sua concepção da História é ética e atual, no prólogo da Crônica de D. João, suas palavras o confirmam: “E nós, engando per ignorancia de velhas scripturas e desvairados autores, bem podíamos ditando errar, porque, escrevendo homem do que nom é certo, ou contará mais curto do que foi, ou falará mais largo do que deve; mas mentira em este volume é muito afastada da nossa vontade.” . Embora suas intenções estejam claras na citação acima, manter a imparcialidade dos fatos verificou-se impossível, o que para M. Rodrigues Lapa “Seria desejar muito para aquela época, cuja paixão e cujo ardor nacional o nosso cronista tão bem representa.” . Vale ressaltar, porém, que tal parcialidade deve-se também ao fato de faltar documentos escritos suficientes nos quais pudesse basear-se, nestes casos fez uso de seu admirável senso crítico.
Além de grande e escrupuloso historiador, Fernão Lopes foi também um exímio prosador, cujo estilo permite incluir elementos tais como a religiosidade, ironia, dramaticidade e crítica, os quais soube ordenar como ninguém.
Em suas crônicas não se priva de incluir o povo, a “arraia miúda”, e suas lutas, demonstrando, inclusive, sua simpatia por esta camada social. Ao contrário do que se podia esperar, por sua ligação com a Coroa, faz críticas a nobreza, isenta-se de transformar os reis em heróis infalíveis, pelo contrário, humaniza-os, muitas vezes ridicularizando-os ou ironizando seus feitos.
Alguns dos elementos acima citados podem ser facilmente verificáveis, no delicioso capítulo XIII, da Crônica de D. João, em que Fernão Lopes narra o encontro entre D. João e a Rainha Leonor Telles, a quem pede desculpas por ter-lhe invadido o quarto e matado seu amante. Neste episódio podemos perceber claramente a humanização das personagens, D. João aparece frágil e embaraçado, um homem medíocre, “em obediência à verdade, Fernão Lopes fá-lo protagonista de cenas pouco grandiosas, e dá-lhe até por vezes atitudes um pouco ridículas.” ; em contrapartida Leonor Telles aparece como grande figura, embora adúltera, é mostrada como uma mulher sagaz e inteligente. As ações dos envolvidos são dramatizadas, tornando a narrativa envolvente, o que para A. José Saraiva deve-se também a sua extraordinária oralidade.
Tais pontos levantados levam-nos a acreditar e ratificar que Fernão Lopes foi muito mais que um cronista, foi também um dos melhores prosadores da Literatura portuguesa, tudo que se pode levantar sobre sua obra demonstra sua originalidade e sua visão lúcida sobre a sociedade portuguesa da Idade Média. Suas preocupações para com a verdade, seu senso ético, sua visão de mundo, além de seus méritos literários, são argumentos suficientes para qualificá-lo como alguém ousado e que transcende seu tempo, alimentando-nos com a compreensão da sua e conseqüentemente da nossa época.
Bibliografia:

AMADO, Tereza. Fernão Lopes, o contador de História. Lisboa, Ed. Estampa.
1991.

LOPES, Fernão. Crônica del Rei Dom João I da boa memória. Lisboa, Casa da
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LAPA, M. Rodrigues. Lições de Literatura Portuguesa - época medieval. 8ª ed. rev. e aumentada, Coimbra, Coimbra Ed.. 1973.

MARTINS, Mário. A Bíblia na Literatura Medieval Portuguesa. Lisboa, Bertrand. 1979 ( col. Biblioteca Breve / volume 35)

MOISÉS, Massaud. A Literatura Através dos Textos. 24ª ed., São Paulo, Cultix.
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MONGELLI, L. M. , MALEVAL, M. A. T. e VIEIRA, Y. F.. A Literatura Portuguesa em Perspectiva. Direção Massau Moisés. São Paulo, Atlas. 1992.

PASSOS, Maria Lúcia P. de Faro. O herói na Crônica de D. João I, de Fernão Lopes. Lisboa, Ed.
Império. 1974.
SARAIVA, A. J.. O crepúsculo da Idade Média em Portugal. Lisboa, Gradiva, 1988.
SARAIVA, A. J. e LOPES, Óscar. História da Literatura Portuguesa. Rio de Janeiro, CBP. 1969.

Influências do Sebastianismo na Cultura Portuguesa, escrito pela professora Eleandra e publicado na revista UniABC Humanas - 2009

Resumo

O presente artigo trata a respeito do mito Sebastianista, originado pela crença no retorno de D. Sebastião, morto na Batalha de Alcacer Quibir, no século XVI, e suas influências na cultura portuguesa. O objetivo é o de propor reflexões sobre o poder de um mito para a formação e transformação do pensamento de um povo. Para fazermos a síntese necessária à compreensão do significado que D. Sebastião assumiu no contexto português, tomamos como base obras sobre a História de Portugal de Joel Serrão, José Hermano Saraiva, A. de Oliveira Marques e Francisco Salles Loureiro, que nos dão um panorama relacionado ao período que antecede o reinado de D. Sebastião, assim como conseqüências advindas deste contexto histórico; entre outros, os principais teóricos consultados sobre a cultura portuguesa foram Eduardo Lourenço e Antônio Quadros.


Palavras-chave
Sebastianismo – mito – cultura – Portugal

O surgimento do mito

D. Sebastião nasceu em 1554 e foi filho único de Joana de Áustria e do príncipe D. João, cuja morte se deu aos vinte dias antes de seu nascimento, acabou sendo o único descendente de D. João III, seu avô. Aguardado com muita ansiedade, depositaram-se nele as esperanças de fazer de Portugal um Império Universal com base no Cristianismo. Assim, todas as aspirações portuguesas foram responsáveis para que, desde muito cedo, o “Desejado”, como também era conhecido, carregasse o peso de toda essa responsabilidade. A principal responsável por sua educação foi a rainha, D. Catarina, muito admirada por sua inteligência e prudência. Ao assumir o trono, com apenas quatorze anos, o rei, que educado sob rígidos dogmas católicos para ser um defensor do Cristianismo, revela extrema preocupação em manter a castidade e nutria grande indiferença em relação às mulheres, o que logo passou a ser motivo de preocupação, pois o casamento era essencial para assegurar herdeiros e, assim, o futuro da nação. Além de sua misoginia e do conseqüente medo do casamento – misogamia-, outro aspecto importante que contribui para a formação de sua personalidade intempestiva e inconseqüente é uma educação de cunho cavaleiresco, o que colabora para que o rei interiorize como seu maior ideal a conquista dos países infiéis e o estabelecimento universal do cristianismo. E esse ideal leva D.Sebastião a lutar contra os Árabes no norte da África, em Álcácer-Quibir, no ano de 1578.
Do rei, esperava-se que reabilitasse Portugal da crise sócio-econômica. Assim, cresceu assumindo a postura do cavaleiro medieval, cuja missão era a de devolver ao país as glórias passadas, para colocá-lo novamente como a mais importante nação da Península Ibérica. Segundo Francisco Salles Loureiro:

Foi por volta dos doze anos que em D. Sebastião surgiram mais nítidas as idéias de conquista das terras de infiéis e de nelas implantar a fé cristã, mas dessa consciencialização não podemos dissociar o todo que era a sociedade portuguesa da época. Como vimos, desse corpo de idéias andava impregnada toda a mentalidade nacional, que o expressava, através dos múltiplos canais da opinião pública. (Loureiro, 1989, p. 104).


Toda a expectativa criada em torno do Desejado contribuiu para a formação de uma personalidade problemática, em que são constantes atitudes marcadas pela prepotência, arrogância e inconseqüência. Citando mais uma vez Francisco Salles Loureiro:

Não resta dúvida de que uma criança, gerada e criada nas condições em que o foi D. Sebastião, haveria de possuir marcas psicológicas inapagáveis, que desenham muito das suas posteriores atitudes, com lógica explicação do desiderato final de sua vida - o desastre de Alcácer Quibir. (...) (Idem, ibidem).

A batalha de Álcácer-Quibir constituiu-se na pior tragédia que Portugal poderia sofrer, devido às conseqüências advindas dela. A derrota já era prevista e os mais conscientes sabiam que a empresa era imprudente. Com um exército mal equipado, com poucos soldados e sem um comando experiente, os portugueses foram fragorosamente derrotados pelos Árabes, visto que metade dos soldados foi morta e a outra metade presa, segundo J.H. Saraiva, dentre os mortos figurava o próprio rei.
Com a morte do jovem rei, em Alcácer Quibir, Portugal passou a ser governado pela Espanha. Por outro lado, a crise que se fazia sentir desde o reinado de D. João III agravara-se. Suas causas são a grande concorrência de comércio internacional das especiarias e drogas orientais, a diminuição da entrada de metais preciosos e um grande declínio da produção agrícola (Loureiro 1989: 15). Diante deste status quo Portugal perde totalmente sua auto-estima, que antes havia sido prepotência, provocada pelas conquistas marítimas. Cai num profundo desalento e desencanto, e, assim, cria-se a atmosfera necessária para o surgimento do Sebastianismo. Podemos dizer, que a partir daí, não assistimos apenas ao surgimento do mito, mas também o imaginário português mergulhar cada vez mais profundamente nele. Sua força é tão intensa que ele acaba atravessando o Atlântico. No nordeste brasileiro, assim como em Portugal, D. Sebastião, até hoje é parte integrante do inconsciente coletivo.
Porém alguns historiadores chamam a atenção para o fato de que assim como a crise sócio-econômica, a origem do Sebastianismo também é anterior ao rei D. Sebastião. No século XVI, um sapateiro chamado Bandarra escreveu várias trovas proféticas que anunciavam a chegada de um messias que traria a recuperação do país em crise. Estas profecias foram influenciadas pelo mito espanhol do Encoberto, bastante difundido em Portugal. Após o fracasso na batalha de Alcácer-Quibir, todas as coisas que já não estavam boas pioraram, pois a aventura de D. Sebastião foi extremamente onerosa para o país, contudo, o povo passou a acreditar que o Desejado havia sido destemido e heróico, defendendo os interesses de Portugal e do Cristianismo, acreditava-se ainda que ele não havia morrido e, portanto, retornaria para retomar o poder e salvar a pátria. O mito se estabelece a partir destas interpretações oriundas do desejo que acaba, por assim dizer, subvertendo o real.
Em 1640, com a restauração do governo português, as esperanças, até então depositadas em D. Sebastião, são transferidas para D.João IV, o qual, acreditavam, era a reencarnação do mito que estabeleceria o tão sonhado Quinto Império. Esta crença foi defendida pelo Padre Antonio Vieira no Sermão dos bons anos, um dos articuladores da Restauração. Quando esteve em missão no Brasil, difundiu essas crenças e, como já dissemos, em outras palavras atrás, o mito sebastianista fincou raízes no inconsciente do sertanejo nordestino. Como exemplo, chamamos a atenção para a identificação entre Antonio Conselheiro e D. Sebastião.
Contudo o governo de D. João IV não foi capaz de resgatar o país da crise em que estava inserido, mas as esperanças e sonhos de justiça e paz dos sebastianistas não morreram e foram transferidas para os futuros governantes, sucessivamente. Eduardo Lourenço, em o Labirinto da saudade, fala sobre Vieira e os anseios portugueses, ressaltando que:

É difícil conceber que a confusão entre o real e o sonho possa ir mais longe do que o foi na cabeça de António Vieira das alegações diante do Santo Ofício, mistura única de lucidez delirante e delírio divino. Nele se operou como em ninguém mais a conversão da nossa longa ansiedade pelo destino pátrio em exaltada aleluia, a transfiguração do simples ‘cantar de amigo’ com que nos embalámos no alvorecer inquieto, em cantata sublime ao Quinto Império. (Lourenço, 1992, p. 23).

Considera-se, ainda, que o Sebastianismo tenha recebido influências do Paracleto e o do mito do Rei Artur, cuja lenda foi enormemente difundida em toda a Península Ibérica. Como nos diz a lenda, morto, Artur é levado para a ilha de Avalon de onde retornará numa manhã de nevoeiro. Quanto ao Paracleto, também conhecido como o Império do Espírito Santo, do qual o mito do Quinto Império seria um resultante direto, trata-se, segundo a descrição de António Quadros:

“do que foi a coroação de um homem pobre como Imperador do Espírito Santo. Em Alenquer, os próprios Reis e Nobres o serviam, sendo-lhe posta ritualmente na cabeça a coroa imperial, encimada por uma pomba, simbolizando o Paráclito. (...) Estamos perante uma festa ou auto profético, inspirado sem dúvida na teoria das três idades, de Joaquim de Flora, monge cisterciense calabrês, que no século XII, inspirado no passo pentecostal do Evangelho de S. João e no Apocalipse deste mesmo evangelista, profetizou que, depois da Idade da Fraternidade Universal e da Paz, tempo das Bem-Aventuranças, período histórico final em que toda a terra seria um templo, o templo do Santo Espírito, em que os homens passariam a ler pelo Evangelho Eterno.” (Quadros, 1989, p. 46).


O Sebastianismo, por sua força e influência na História e cultura de Portugal, vem servindo como tema na prosa e na poesia portuguesa desde o Romantismo. Entre os mais importantes escritores portugueses que tratam sobre o mito citamos Almeida Garret, António Nobre, Fernando Pessoa e o contemporâneo Almeida Faria, no panorama da literatura brasileira destacamos Ariano Suassuna.


Mito e cultura

Por toda a sua complexidade, o mito sebastianista analisado pelos estudiosos sob diferentes aspectos, no que se referem as suas influências na história e no desenvolvimento de Portugal. Uma das suas características é a de que contribuiu para manter o nacionalismo e a crença na recuperação do país. Porém, contrariamente a esta posição, tal crença, ao invés de desenvolver o espírito de busca do povo, mais serviu para lhe acentuar o perfil acomodado, de quem espera passivamente por um salvador que lhe resolvesse todos os problemas e, desta maneira, submete-se a sucessivos governos que pouco progresso proporcionaram, mantendo o país, a partir do século XVI, aquém de seus vizinhos europeus.
Como observa António Quadros em Poesia e filosofia do mito sebastianista:

O profetismo mítico - ucrônico português, tendo tido embora o mais valioso significado ôntico e a mais fecunda das funções psico sociológicas (...), resultou, pois no mesmo plano político em que pretendia situar-se, em avaliação irrealista. Se, durante o século XVI e parte do século XVII, alimentou eficazmente a chama patriótica, acendendo ou reacendendo o entusiasmo e a fé do povo no destino independente da nação, ao mesmo tempo a espera prolongou-se, acabando por provocar uma expectativa de inércia. (Quadros, 1983, p. 159).

Sobre esta questão citamos, novamente, Eduardo Lourenço:
(...) esse ciclo de sebastianismo activo que representou, ao mesmo tempo, o máximo de existência irrealista que nos foi dado viver; e o máximo de coincidência com o nosso ser profundo, pois esse sebastianismo representa a consciência delirada de uma fraqueza nacional, de uma carência, e essa carência é real. (Lourenço, 1992, p. 22).

Sobre o caráter nacionalista que o sebastianismo provoca, este mesmo ensaísta chama a atenção para como ele foi amplamente explorado no fascismo salazarista como elemento de manipulação:
souberam utilizar com inegável habilidade o recurso à mitologia patriótico-clerical mais estafada mas não de todo exausta, opondo ao ‘internacionalismo marxista’ uma resistência de todos os instantes. (Lourenço, 1992, p. 31).

Desde a formação de Portugal, observamos que a criação de heróis cristãos e seus feitos extraordinários presentes na História portuguesa revelam uma tendência ou uma vocação para o miraculoso e celestial, extremamente influenciada pela religião católica e pelo judaísmo.
Essa maneira de ser do povo português exercerá sua influência em seus historiadores e ficcionistas da forma como se refere aos escritos da História de Portugal por Eduardo Lourenço:

As ‘Histórias de Portugal’, todas, se exceptuarmos o limitado mas radical e grandioso trabalho de Herculano, são modelos de ‘robinsonadas’: contam as aventuras celestes de um herói isolado num universo previamente deserto. Tudo se passa como se não tivéssemos interlocutor. (E esta famosa forma mentis reflecte-se na nossa criação literária, toda encharcada de monólogos, o que explica, ao mesmo tempo, a nossa antiga carência de fundo em matéria teatral e romanesca.). (Lourenço, 1992, p.18)

O Sebastianismo é o maior e mais importante exemplo desta tendência portuguesa de crer em milagres e heróis, pois sua influência pode ser observada até hoje. Tal mito é considerado segundo vários autores, como o messianismo judaico-cristão nacionalizado. A figura de D.Sebastião acaba se confundindo com a do Messias, que virá para redimir seu povo. Ao que dissemos a respeito do comportamento do povo português, podemos acrescentar que o período da história em que viveu D. Sebastião está marcado por uma séria crise sócio-econômica. Ligando os dois fatos acima arrolados, verificamos que se cria, em torno do trágico rei, a crença coletiva em soluções milagrosas e desmedidas. Acreditamos, porém, que se este mito já está tão arraigado, procurar entendê-lo e assumi-lo seria um grande passo para um país que há muito procura por sua identidade cultural. È preciso respeitar as “verdades” existentes sobre seus mitos para, então, transcender a elas. Assim como a “verdade” pode nascer da mentira repetida, a repetição da idéia sobre o retorno do rei, acabou sendo incutida como verdade no inconsciente do povo português, o que não deve ser analisado de maneira racionalista e preconceituosa, simplesmente, citando Mircea Eliade: “(...) o mito narra como, graças às façanhas dos Entes Sobrenaturais, uma realidade passou a existir, (...). É sempre, portanto, a narrativa de uma ‘criação’: ele relata de que modo algo foi produzido e começou a ser.” (Eliade, 2000, p.11). Conforme Georges Gusdorf: “O mito está ligado ao primeiro conhecimento que o homem adquire de si mesmo e de seu contorno: mais ainda, ele é a estrutura deste conhecimento.” (Gusdorf, 1980, p.23). Desta maneira, Portugal não se define caso descarte seu imaginário, ou seja, desconsidere as verdades míticas já arraigadas na sua cultura. Novamente, segundo Gusdorf:

Ainda se a primeira afirmação do homem já o separa do mundo, parece pois que a consciência mítica tenha por função reintegrá-lo no universo. (...) é preciso reconhecer que o mito não constitui um abandono puro e simples de um pensamento fabulador e gratuito análogo ao do sonho ou da poesia. O mito não se situa fora do real, já que ele se apresenta como uma forma de estabelecimento do real. (Gusdorf, 1980, p. 32).

Essa grande influência que um mito pode exercer sobre um povo, no caso, o português, acaba por desencadear um processo histórico repleto de fracassos, que se define e se perpetua através da repetição da História contada. Para ratificar o comentário, valemo-nos de um fragmento extraído de Eduardo Lourenço em que alerta sobre a ausência do olhar crítico do povo português sobre si mesmo:

Quando não é o sintoma mesmo de uma degradação masoquista é um jogo que faz parte intrínseca do a-criticismo, do irrealismo de fundo de um povo que foi educado na crendice, no milagrismo, no messianismo de pacotilha, em suma, no hábito de uma vida pícara que durou séculos e que a aristocracia indolente e ignara pôde entreter à custa de longícuos Brasis e Áfricas. (...) Esse sicofantismo nacional ao serviço de Deus chegou para alimentar a nossa vaidade de defensores da Fé, mas converteu-nos em adoradores extáticos no melhor dos casos e em refinados hipócritas no pior, criando em nós essa espécie de indiferença a toda a verdade que não seja vivida colectivamente, a inventores geniais de ‘concórdias’ e ‘verdades médias’ que naturalmente não poderiam jamais conduzir aos Descartes, aos Pascal, aos Torricelli e muito menos aos Espinosa. (Lourenço, 1992, p. 49,50).

Portanto, uma reavaliação de Portugal deve incluir seus mitos e seu imaginário, para um melhor entendimento do presente. De acordo com Eduardo Lourenço, em sua obra mais recente, Mitologia da saudade:

Desde o século XIX, com o nascimento de uma História digna desse nome, imaginou-se, e com razão que seria a História o lugar por excelência da compreensão de nós mesmos como passado coletivo e, por conseqüência, a leitura mais adequada de um povo como destino. Da poética dessa História excluía-se, por definição, o que na ordem da informação do passado relevava da lenda ou do mito.(...). O imaginário transcende a mitologia constituída ou plausível, mas é na mitologia, na ficcionalização imanente à história vivida, que melhor o podemos apreender. Adotando uma célebre fórmula de Kant podemos dizer que a Mitologia sem História é vazia e a História sem Mitologia, cega. (Lourenço, 1999, p. 92,93).

Desta forma e da maneira como estabelecemos este debate percebemos que uma profunda influência do sebastianismo se apresenta até os dias atuais em Portugal e também no Brasil, assunto que poderá ser explorado mais profunda e especificamente em um próximo trabalho.

Referências Bibliográficas
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______________. Mito e realidade. 5ª ed., São Paulo, Perspectiva, 2000.
CUNHAL, Álvaro. A revolução portuguesa. O Passado e o Futuro. 2ª ed., Lisboa, Edições Avante.1994.
GARCIA, José Manuel. História de portugal: uma visão global. 2ª ed., Lisboa, Editorial Presença,1983.
GUSDORF, Georges. Mito e metafísica. Trad. Hugo di Prímio Paz. São Paulo, Editora Convívio,1980.
LOUREIRO, Francisco Sales. D. Sebastião e Alcácer Quibir. Lisboa, Publicações Alfa. 1989.
LOURENÇO, Eduardo. Mitologia da saudade: seguido de Portugal como destino.São Paulo, Companhia das Letras, 1999.
___________________. O labirinto da saudade. 5ª ed., Lisboa, Publicações Dom Quixote,1992.
MARQUES, A. H. de Oliveira. História de Portugal. 2 volms., Lisboa, Palas Editores, 1973.
PORTUGAL. Ministério da Cultura. Instituto Português do Livro e das Bibliotecas. Memória em movimento: literatura portuguesa do século XX.
¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬¬QUADROS, António. A idéia de Portugal na literatura dos últimos cem
anos.Lisboa, Fundação Lusíada, 1989.
________________. Poesia e filosofia do mito sebastianista: Polémica, História e Teoria do Mito. Lisboa, Guimarães & Cª Editores, 1983.
SARAIVA, José Hermano. História concisa de Portugal. 21ªed., Publicações Europa-América, 2001.
SARAIVA, A. J. e LÓPES. História da literatura portuguesa. Porto, Porto Editora, 1995.
SERRÃO, Joel. Dicionário de História de Portugal. 4 volms. Porto, Figueirinhas, 1971.
SERRÃO, Joel. Do sebastianismo ao socialismo. Livros Horizonte, 1983.

IMAGENS E INFLUÊNCIAS PORTUGUESAS EM MANUEL BANDEIRA , artigo da professora Eleandra publicado no Caderno UniABC de Letras, em 2002

Palavras chave: Manuel Bandeira; poesia; Portugal; Brasil; influências; identidade.

Resumo: Este artigo trata sobre as influências culturais portuguesas presentes na poesia de Manuel Bandeira, poeta singular, que não se deixa contaminar pelo ufanismo exacerbado de seus contemporâneos modernistas. O objetivo é lançar um olhar crítico sobre algumas de suas poesias em que está muito clara a presença de Portugal e de seus poetas, permitindo, pela breve análise dos textos selecionados, entrever a busca do Modernista pela preservação da união entre a cultura lusa e a brasileira.


Introdução

Manuel Bandeira e o Modernismo Brasileiro:

Manuel Bandeira, embora apoiasse as novidades e os ideais modernistas, procurou manter-se afastado dos excessos e radicalidades típicas e presentes na maioria dos modernistas desta primeira fase. Sua postura heterodoxa, por assim dizer, resulta de um olhar mais amadurecido do que o dos demais contemporâneos. O combate ao passado, baseado nos movimentos da vanguarda européia, e às influências estrangeiras, principalmente no que se refere a Portugal, pode ser entendido como a principal bandeira ideológica modernista, mas que será utilizada por Manuel Bandeira com menos ufanismo e maior discernimento.
No desenvolvimento deste trabalho, pretendemos demonstrar imagens portuguesas em algumas poesias, através das quais Manuel Bandeira, despojado de preconceitos, expressa respeito e afetividade por Portugal. Ao assumir as influências lusitanas, não trai o ideal de uma cultura autenticamente brasileira, talvez, por entender que elas devem ser tomadas, juntamente com as indígenas e africanas, como fonte para construção de nossa identidade.
O poeta em questão, ao se posicionar de maneira mais flexível e à margem do movimento, acaba por não se contradizer como acontece com a maioria dos modernistas de 22, Massaud Moisés diz o seguinte sobre eles: “Nem sempre conscientes das motivações profundas, modernistas e modernos, aqueles, surgidos com a Semana de Arte Moderna e esses, fora dela ou contra ela, laboravam sobre paradoxos. Se revolucionariamente modernos pelo flanco estético, e até ideológico às vezes, mostravam-se não modernos por outro. Daí que o exame dos autores de 1922 em diante os mostra hesitantes entre o vanguardismo e a reiteração de fórmulas consideradas peremptas. Modernistas e tradicionalistas a um só tempo, recusavam o velho em prol do novo, mas retomavam as soluções ultrapassadas por não perceber que as expulsavam pela porta principal e que elas retornavam pelos fundos. (...) Afinal, quando pretendem recuperar nossa brasilidade e com ela a imagem verídica do nosso indígena e do nosso negro, preconizavam, posto que sob nova óptica, a volta ao passado.” e sobre Manuel Bandeira que “modernista por adoção”, não foi o “grande poeta do movimento modernista, mas certamente uma das vozes mais sonoras da poesia moderna brasileira.”

Análise

Imagens de Portugal nas poesias “Portugal, meu avozinho” e “Craveiro, dá-me uma rosa”


PORTUGAL, MEU AVOZINHO

Como foi que temperaste,
Portugal, meu avozinho,
Esse gosto misturado
De saudade e de carinho?

Esse gosto misturado
De pele branca e trigueira,
-Gosto de África e de Europa,
Que é o da gente brasileira?

Gosto de samba e de fado,
Portugal, meu avozinho.
Ai Portugal que ensinaste
Ao meu Brasil o teu carinho!

Tu de um lado, e do outro lado
Nós...No meio o mar profun-
do...
Mas, por mais fundo que seja,
Somos os dois um só mundo.

Grande mundo de ternura,
Feito de três continentes...
Ai, mundo de Portugal,
Gente mãe de tantas gentes!

Ai, Portugal de Camões,
Do bom trigo e do bom vinho,
Que nos deste, ai avozinho,
Este gosto misturado,
Que é saudade e que é carinho!

“Portugal, meu avozinho” consta em seu último livro Mafuá do malungo, composto por jogos onomásticos, dedicatórias rimadas, liras e sátiras políticas de circunstâncias, e que faz parte de uma fase mais madura do poeta. Nesta obra, o poeta não se priva de utilizar formas combatidas na poesia modernista de 22, como a redondilha maior, tão tradicional da literatura portuguesa, da qual se valeu para compor a poesia em questão.
O poema realça imagens culturais e sentimentos característicos de Portugal. A começar pelo título, temos “avozinho” - repetindo-se durante todo o poema-, palavra que estabelece o grau de parentesco entre Portugal e Brasil, e o diminutivo, além de expressar afetividade e “carinho”, é maneira de falar peculiar aos portugueses. Homenageia Portugal e ressalta o elo que há entre este e o Brasil, que herda um “gosto misturado/ De saudade e de carinho”, isto é, o caráter saudosista e sentimentalista do povo e da literatura portuguesa. Herdeiros somos, também, da mistura de raças “De pele branca e trigueira” e de culturas “Gosto de samba e de fado”. Traçando os paralelos entre as duas culturas, proclama a união entre elas que, apesar de aparentemente separadas pelo “mar profundo”, ou ainda, pelas diferenças naturais existentes entre dois continentes tão distintos, constituem “um só mundo”.


CRAVEIRO, DÁ-ME UMA ROSA


Craveiro, dá-me uma rosa!
Mas não qualquer, General:
Que eu quero, Craveiro, a rosa
Mais linda de Portugal!

Não me dês rosa de sal.
Não me dês rosa de azar.
Não me dês, Craveiro, rosa
Dos jardins de Salazar!

A Portugal mando um cravo.
Mas não qualquer, General:
Mando o cravo mais bonito
Da minha terra natal!


Não craveiro de Juscelino,
Nem de nenhum general!
Não cravo (se há lá cravos!)
Da futura capital.

Mando o puro cravo branco
Da pátria não oficial:
Cravo de amor, - sem política
Só de amor, meu General.


Este é outro poema presente no Mafuá do malungo e em que Manuel Bandeira dirigi-se ao General Craveiro Lopes, quando este visitou o Brasil, referindo-se à falta de liberdade que imperava em Portugal . Tal qual “Portugal, meu avozinho” o poema acima é desenvolvido em redondilhas maiores e dividido em quartetos. Além das coincidências formais, em “Craveiro, dá-me uma rosa”, o poeta sugere um vínculo entre os dois países, através da troca cultural, “a rosa” pelo “cravo”, que por serem caracterizados pela beleza, podem simbolizar as artes. Enfim, um elo de amizade e cultura entre dois países irmãos que só pode estabelecer-se pelas vias culturais e jamais pela política obscurantista de então, que, pela sua miopia, só visam ao progresso alicerçado em ideais estéreis, chegando, como se pode constatar hoje, a lugar nenhum.

Poesias dedicadas aos Poetas Portugueses e suas Influências

Agora através de algumas homenagens a poetas portugueses, continuamos a observar o respeito de Manuel Bandeira pela literatura portuguesa e a influência desta no poeta. Aqui vale citar uma passagem de Jorge de Sena em que se refere ao “não-anti-portuguesismo” do poeta, ou seja, uma não preocupação em demonstrar suas simpatias portuguesas, ao contrário do que aconteceu com Cecília Meireles, Ribeiro Couto e Murilo Mendes, que ponderavam sobre os riscos de serem tachados por suas “excessivas e impróprias simpatias portuguesas”: “Nem pela cabeça me passou ou passa que Bandeira tivesse ponderado esses riscos, acima dos quais sua unânime glória já pairava; mas não é de se excluir que, nos seus desejos de paz e respeito, algo andasse no subconsciente de um poeta que nunca tirou dos seus poemas completos as homenagens esplêndidas a poetas portugueses (...).”


IMPROVISO


Glória aos poetas de Portugal.
Glória a D. Dinis. Glória a Gil
Vicente. Glória a Camões. Glória
a Bocage, a Garret, a João
de Deus (mas todos são de Deus,
e há um santo; Antero de Quental).
Glória a Junqueiro. Glória ao sempre
Verde Cesário. Glória a Antônio
Nobre. Glória a Eugênio de Castro.
A Pessoa e seus heterônimos.
A Camilo Pessanha. Glória
a tantos mais, a todos mais.
- Glória a Teixeira de Pascoais.

Tomamos como ponto de partida o poema “Improviso”, também do livro Mafuá do malungo.
O poema composto em octossílabos, -empregados na poesia cortesã da Idade Média e calcada em moldes provençais, “que até meados do século findo, e ainda depois, os poetas de Portugal e do Brasil geralmente não o consideraram digno de ser contemplado em suas composições.”- , cujo título “Improviso” remete ao gênero largamente praticado na Idade Média sob a forma de epigramas, madrigais e quadrinhas musicadas. Manuel Bandeira para saudar os poetas portugueses, utilizou-se de uma estrutura clássica com o mesmo despojamento com que se utilizava dos versos livres, o que se verifica nos dois poemas citados e como se verificará nos três próximos poemas.
Em seu “Improviso”, o poeta faz referência a alguns dos principais nomes da Literatura Portuguesa de todos os tempos. Seguindo a ordem cronológica, glorifica e coloca em um plano divino os poetas reconhecidos como ícones, dos quais não só literatos portugueses, como também os brasileiros, receberam e recebem influências.

A CAMÕES


Quando n’alma pesar de tua raça
A névoa da apagada e vil tristeza
Busque ela sempre a glória que não passa,
Em teu poema de heroísmo e de Beleza.

Gênio purificado na desgraça,
Tu resumiste em ti toda a grandeza:
Poeta e soldado... Em ti brilhou sem jaça
O amor da grande pátria portuguesa.

E enquanto o fero canto ecoar na mente
Da estirpe que em perigos sublimados
Plantou a cruz em cada continente

Não morrerá sem poetas nem soldados
A língua em que cantaste rudemente
As armas e os barões assinalados.


O soneto “A Camões” está presente no primeiro livro de Manuel Bandeira, A cinza das horas. Para esta homenagem a Camões, o autor utiliza-se da intertextualidade , tão em voga na poesia moderna e muito freqüente em Manuel Bandeira, e dela vai se servir para reescrever outras tantas formas clássicas, atitude que podemos entender como mais uma maneira do poeta de cultivar e preservar a tradição. Neste poema, o poeta vale-se da forma mais cultivada por Camões, o soneto, e do primeiro canto de Os Lusíadas, enfim, mescla a lírica e a épica para exaltar a importância da poesia camoniana para Portugal. Manuel Bandeira parece entender que muito maior motivo de orgulho da “raça” portuguesa não são suas viagens ultramarinas, exaltadas por Camões e sim a obra de que ele se serviu para cantá-las, afinal, as glórias conquistadas através das navegações, no decorrer da história de Portugal, foram sendo embotadas por uma sucessão de desastres, causadores da “vil tristeza” e do melancólico saudosismo, presentes até hoje na “grande pátria portuguesa”, e que podem ser amenizados, como de fato o são, pela obra do universal e imortal Camões.
A poesia de que tratamos não é a única em que Manuel Bandeira faz referência a Camões, em Mafuá do malungo aparecem três outras referências ao poeta: nas poesias já citadas “Portugal, meu avozinho” e “Improviso”; e em “Ad Instar Delphini”, invocando o poeta: “Camões, valei-me! Adamastor, Magriço”. É importante acrescentar que Camões, ao contrário do que se podia esperar, foi homenageado pela maioria dos poetas modernistas brasileiros, acerca da presença de Camões no Modernismo brasileiro, Gilberto M. Teles diz o seguinte: “Tinha-se a impressão de que o Modernismo ia também combater Camões, que trazia para a época dupla conotação de passado: o da Literatura e o do colonialismo português. Mas a surpresa é que, com exceção apenas do atualíssimo João Cabral de Melo Neto (...), todos os poetas modernistas pagaram seu tributo à obras de Camões, transformando-a, lírica e épica, em temas de poesia e através de alusões, paráfrases, parábolas, através de todas as formas de referência, procuraram homenagear Camões (...).” e explica tal ocorrência pelo fato de que entendiam “que Camões estava acima dos nacionalismos e das ideologias de esquerda ou de direita. (...) Camões é sentido como gênio, autor universal, e podia, portanto ser festejado sem isso implicar “colonialismo literário” (...).”

A ANTÔNIO NOBRE


Tu que penaste tanto e em cujo canto
Há a ingenuidade santa do menino;
Que amaste os choupos, o dobrar do sino,
E cujo pranto faz correr o pranto:

Com que magoado olhar, magoado espanto
Revejo em teu destino o meu destino!
Essa dor de tossir bebendo o ar fino,
A esmorecer e desejando tanto...


Mas tu dormiste em paz como as crianças.
Sorriu a Glória às tuas esperanças
E beijou-te na boca... O lindo som!

Quem me dará o beijo que cobiço?
Foste conde aos vinte anos... Eu, nem isso...
Eu, não terei a Glória... nem fui bom.

Petrópolis, 3..2. 1916

“A Antônio Nobre” é outro soneto do livro A cinza das horas, em que também podemos observar a intertextualidade. Há uma referência clara de Manuel Bandeira ao segundo terceto do soneto formado de decassílabos, sem título, presente no capítulo “Sonetos - 3”, da única obra de Antônio Nobre, Só; a estrofe é a seguinte: “O meu Condado, o meu condado, sim!/ Porque eu já fui um poderoso Conde,/ Naquela idade em que se é conde assim...” . Massaud Moisés faz as seguintes observações acerca de “A Antonio Nobre”: “de silhueta Parnasiano Simbolista, e fruto da coincidência entre a moléstia de Manuel Bandeira e do poeta português, traduz uma predileção estética da juventude, a poesia de Manuel Bandeira constitui uma espécie de diário íntimo, registro lírico dum dia-a-dia em que a arte era o prato obrigatório.”
Aqui, mais uma vez, podemos constatar a influência de um poeta lusitano, Antonio Nobre é uma constante na obra de Manuel Bandeira, verificáveis em seu coloquialismo e penumbrismo . Em “A Antonio Nobre”, Manuel Bandeira expressa sua homenagem ao poeta que o emociona “E cujo pranto faz correr o pranto”, e com quem se identifica “Revejo em teu destino o meu destino!”; porém a “Glória” de ter morrido ainda jovem não “sorriu” a Manuel Bandeira, que lamenta, com sua habitual modéstia, não ter tido a mesma sorte, nem o mesmo talento: “Eu, não terei a Glória.nem fui bom.”


JAIME CORTESÃO


Honra ao que, bom português,
Baniram do seu torrão:
Ninguém mais que ele cortês,
Ninguém menos cortesão.


Para finalizar a presente exposição sobre as homengens de Manuel Bandeira a poetas portugueses, temos uma quadrinha em redondilhas maiores que o poeta dedica a Jaime Cortesão, presente em Mafuá do malungo.
Embora poeta e dramaturgo, Jaime Cortesão vai se destacar pelas suas obras historiográficas, que começa a escrever em 1922, após ter se afastado do movimento da Renascença Portuguesa, de acordo com Antonio José Saraiva: “Desde 1922, por estímulo das comemorações da independência brasileira, a sua principal actividade literária inflecte-se para a historiografia. (...) Exilado com pequenas intermitências desde 1927 a 1957, realiza no estrangeiro, e sobretudo no Brasil desde 1940, uma série de trabalhos, quer de investigação erudita, quer de síntese, que contribuem para uma importante revisão da teoria geral da História portuguesa.
Por hora, nos importa sobretudo o que este autor contribuiu para o nosso conhecimento sobre a história da cultura brasileira que tem como marco inicial a Carta de Pero Vaz de Caminha, é de Jaime Cortesão o melhor estudo sobre ela, sua edição data de 1943, três anos depois de ter sido obrigado a se exilar no Brasil, dentre os seus objetivos, deve ser salientado o de estreitar os laços entre Portugal e Brasil , objetivo compartilhado por Manuel Bandeira, que jamais se privou de valorizar a cultura portuguesa, pelo que possui de realmente grande e por ser raiz da cultura brasileira. Considerando tais dados sobre Jaime Cortesão, é possível entender a homenagem que Manuel Bandeira confere ao “bom português”, referindo-se ao fato de ele ter sido exilado - “banido” - de sua pátria.

Conclusão

Esperamos com este trabalho ter demonstrado a presença de imagens de Portugal e suas influências na poesia de Manuel Bandeira, o qual soube aproveitá-las muito bem e sem preconceitos. Os poemas apresentados são somente alguns dentre os muitos em que se pode verificar a presença da literatura portuguesa na obra do poeta, porém pareceram-nos suficientes para comprovar o que se pretendia, as cinco poesias estudadas dão mostras de sua visão sobre Portugal e a necessidade de preservar suas imagens, para construir ou definir a cultura brasileira. Manuel Bandeira “nada contra a corrente” do Movimento Modernista brasileiro, ao mesmo tempo em que procura cultivar determinadas posturas modernistas. Seu caráter libertário ou anárquico não permite que ele se deixe aprisionar pelos ditames do Modernismo, dentre eles o da negação à cultura lusitana, a qual, como já foi dito, o poeta entende ser fonte de sua própria cultura.


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Manifestações sócio-culturais e religiosas na prosa portuguesa de XIV a XVI, artigo da Professora Eleandra, publicado na revista UniABC-Humanas2005

As manifestações sócio-culturais e religiosas medievais anunciadas na prosa doutrinária portuguesa dos séculos XIV a XVI



Resumo

O objetivo deste artigo é demonstrar que as manifestações políticas, religiosas e culturais dos séculos XII e XIII, no Ocidente - com base no livro Mudanças e Rumos: o Ocidente Medieval - anunciaram muitas idéias e valores morais e religiosos presentes em obras doutrinárias datadas entre os séculos XIV e XVI, em Portugal, são elas: Livro da Montaria, Leal Conselheiro, Livro da ensinança de bem cavalgar toda sela, Horto do Esposo, Livro da Virtuosa Benfeitoria, Crônica de D. João I, Narrativas dos livros de linhagens, Boosco Deleitoso e Flos Santorum.


Palavras-chave

Idade Média, Portugal, Ocidente, Religião


Os problemas comuns entre as nações em formação no Ocidente

São vários os pontos comuns que dizem respeito à formação das nações do Ocidente Medieval tratadas em Mudanças e Rumos: o Ocidente Medieval, tais nações ascenderam, tendo de enfrentar obstáculos similares, porém de maneiras diferentes, pois abarcavam características peculiares.

A questão do crescimento demográfico verificou-se entre os séculos XI e XIII, na Inglaterra, França, Itália, Alemanha, Espanha e Portugal, em todos estes países os motivos foram a melhoria climática, causadora de melhores condições para agricultura e, conseqüentemente, melhores condições de vida; a ausência de epidemias e a diminuição de invasões estrangeiras. A preocupação com a delimitação e expansão das fronteiras, também será uma constante em todo o Ocidente. Uma vez constituídas as nações, observam-se preocupações em relação ao poder, travando constantes desavenças entre a nobreza laica e a Igreja. Este período será marcado pelo surgimento e ascensão de uma nova camada social, a burguesia, que se subdividia em banqueiros, artesãos e comerciantes, e passa a ser uma preocupação para a aristocracia, que sente seu poder ameaçado, e ao clero, que terá de modernizar suas pregações, pois o estilo tradicional já não é tão eficaz, no que diz respeito à doutrinação de fiéis; voltados a esta questão, ascendem os cluniacenses e os cistercienses, e, posteriormente, os franciscanos e os dominicanos.

Em relação às questões culturais, os países citados sentiram a necessidade de um novo sistema de ensino, momento em que nascem as primeiras universidades, disseminando a filosofia clássica e o direito romano, além da teologia. Entre os séculos XII e XIII, na arquitetura, há o predomínio do estilo românico, o qual será, aos poucos, substituído pelo gótico. A língua de cada nação vai se formando gradativamente, inicialmente mantém as influências de nações vizinhas e dos antigos invasores, aos poucos vai assumindo uma identidade; o que se pode comprovar, através da produção literária de cada país, suas maiores expressões são as canções de gesta, os épicos, influenciados pelas cruzadas, etc.

Em todo o Ocidente medieval, houve oscilações neste período de formação das nações, momentos de maior ou menor estabilidade política, nem sempre as relações entre a monarquia e o clero eram amistosas, em cada país, pode-se verificar um rei mais habilidoso para tratar das questões de questões políticas e sociais, promovendo vários avanços e conquistas relativas ao poder, e um outro que colocasse tudo a perder, foram comuns os casos de excomunhão de reis. Em Portugal, a luta pelo poder travada entre o rei e a Igreja, resultaram em várias excomunhões, foram vitimados pela excomunhão: Sancho I, Afonso II, Sancho II - além de excomungado, deposto do trono - e por último Afonso III; será D. Dinis quem vai assinar um acordo de paz com a Igreja. É a partir de D. Afonso III, que Portugal está mais preparado para pensar em sua identidade “embora sob o peso de fragmentação resultante das sangrentas guerras civis, que puseram clero e nobreza - agudos problemas que vinham desde Afonso Henriques - em permanente confronto com a realeza.” . D. Dinis, seu sucessor, é responsável pelo plantio de sementes de modernidade, “o novo rei cresceu numa corte culta, onde se cultivava com fervor a poesia d’oc, considerada responsável pela sobrevivência do lirismo galego-português, em evidente declínio após seu reinado. De sua intensa política cultural permaneceram como medidas mais destacáveis a fundação da Universidade em 1290 e a determinação do uso exclusivo da língua portuguesa em documentos judiciais, anunciadoras de que também para Portugal se abriam outros horizontes.” Porém, logo após seu reinado ( 1279 - 1325 ), Portugal, assim como toda a Europa, vive um momento de crise, agravada pela peste negra, em que aumentam os problemas sociais, neste momento, a aristocracia entra em decadência, por outro lado, a burguesia está em processo de ascensão; a submissão do trabalhador e salários baixos geram revoltas; todos estes fatores e a baixa expectativa de vida, provocada pelas epidemias, vão provocar um clamor por justiça e paz, é um momento em que a doutrinação cristã se faz necessária, verifica-se, por esse período, a enorme aceitação das ordens mendicantes com a popularização de suas pregações, diferentemente das ordens de cluny, de cister e beneditina.

É em meio a esta necessidade de cristianização, que se dá a ordenação de D. João I, em 1385, rei nomeado pela “vontade de Deus” , com ele se inicia a Dinastia de Avis, a qual é marcada por profunda moralidade cristã. Este é um momento peculiar de Portugal, enquanto os outros países vivem o período da Reforma, os portugueses, sentimentais, não a admitem, possivelmente, por conseqüência da forte beatificação.


A prosa doutrinária em Portugal: a serviço do poder e do status quo


Na literatura, o lirismo galego - português entra em decadência, inaugura-se uma época de prosa, os romances de cavalaria e a prosa doutrinária. Segundo Rodrigues Lapa: “Esta mistura singular e picante de idealismo e positivismo caracteriza todo o século XIV e contribuiu certamente para a idéia dos descobrimentos”. A segunda prosa acabou prevalecendo, “porque o sentimento das realidades levou também de vencida, aquilo que D. Duarte chamou, com admirável propriedade, fantasia sem proveito.” Os homens que estavam agora na galeria eram da antiga burguesia militar, a quem o Mestre de Avis dera foro de fidalguias, gente ávida e pouco propensa aos caprichos da fantasia - à maneira inglesa -. D. João I estava integrado na nova ordem, e, como todo aderente duma nova religião, exagerava por vezes os seus mandamentos. A literatura agora tinha um fim prático: tratava-se de formar homens rijos de corpo e alma para a defesa e expansão da terra. Para isso nada melhor que os desportos”.


Assim, provavelmente entre 1415 e 1433 , é escrito, por D. João I, o Livro da Montaria, cujo objetivo prático era educar a nobreza, transmitindo noções de limites e controle dos sentidos, além de divulgar a prática do desporto. Esta concepção de equilíbrio entre físico e espírito, embora adaptada para os valores da época, é herança milenar da tradição oriental; muito da tradição oriental, aliás, será descoberto por meio das constantes incursões dos italianos ao Oriente. Antes do Livro da Montaria, houve outros tratados sobre desportos, um dos mais famosos: o Livro da Falcoaria, do monarca italiano Frederico II, no século XIII, que certamente influenciou D. João.

Com os mesmos propósitos do Livro da Montaria, o Livro da Ensinança e do Bem Cavalgar Toda Cela, de D. Duarte, tem outro tom, é ainda mais erudito e racional. Tendo como base suas próprias experiências, ensina aos súditos suas teorias sobre o a formação do bom cavaleiro, porém inclui temas sobre a vontade e a educação, fazendo-o transcender seu caráter pragmático e moralista. D. Duarte, neste livro, emprega, além da filosofia de Santo Agostinho, refletida no que se refere à condenação dos sentidos; as idéias do racionalismo cristão de São Tomás de Aquino, compreende necessário submeter assuntos religiosos à razão. No livro Leal Conselheiro, também de D. Duarte, observamos os mesmos objetivos moralizadores e as mesmas recorrências filosóficas, este livro não trata de nenhum desporto especificamente, mas fala sobre suas experiências pessoais e sentimentos, mostra como se pode vencer as fragilidades, submetendo os sentidos à religiosidade e à razão.

Estas obras refletem, além da necessidade de doutrinação ou educação da nobreza, a tentativa de resgatar o monarca como herói, ideal que vai sendo abalado no decorrer dos séculos XII e XIII, com os monarcas que sucederam o primeiro rei de Portugal, figura lendária e heróica, presente no imaginário português.

Encerrando o ciclo das obras de autoria dos integrantes da Dinastia de Avis, citaremos o Livro da Virtuosa Benfeitoria, do Infante D. Pedro, que passou grande parte de sua vida viajando pela Europa e colhendo informações sobre as relações políticas dos países por que passava, as quais somava com sua “cultura sistemática de filosofia e moral”. Estas observações permitiram-lhe verificar as falhas de Portugal, adotando idéias, que julgava as mais apropriadas, para solucioná-las, seus ideais administrativos eram reformadores. Entre as várias colaborações endereçadas ao irmão D. Duarte, está o Livro da Virtuosa Benfeitoria, inspirado na obra de Sêneca, De Beneficcis - a retomada dos valores clássicos é uma constante a partir do século XI, na Europa Ocidental - é um ensaio de filosofia política, que objetivava reformar as relações entre as camadas sociais, cuja hierarquização deveria ser revista em Portugal, retomando, inclusive, os ideais do feudalismo. Os objetivos eram os de afirmação do poder monárquico, calcados em conceitos morais e religiosos.

Em se tratando da Dinastia de Avis, parece-nos conveniente lembrar Fernão Lopes, incumbido por D. Duarte de escrever a história dos reis antigos de Portugal, do que resultará a Crônica de D. João I. D. Duarte, consciente das estruturas frágeis em que se encontrava a nação e de sua responsabilidade em mantê-las sob controle, vê como necessária a documentação histórica das conquistas de Portugal e a legitimação da Dinastia de Avis. Fernão Lopes, como historiador, segundo Antonio José Saraiva: “se encontra numa atitude crítica perante a tradição, o seu ponto de vista coincide com o do grupo revolucionário”, porém deve ser considerado sério e metódico, pois procurou transcrever a verdade dos fatos e, na medida do possível, manter a imparcialidade. “Há, todavia, vários níveis da parcialidade de Fernão Lopes. Em primeiro lugar, as Crônicas de D. Pedro, D. Fernando e D. JoãoI apresentam-se claramente como uma justificação e legitimação da nova dinastia e do pessoal dirigente que saiu da insurreição de 1383.”.

Os livros de linhagem, surgidos nos séculos XIII e XIV, têm interesses historiográficos, embora não fixem datas e reproduzam conteúdos lendários e, muitas vezes, anedóticos, pois documentam a genealogia dos fidalgos. Conforme Antonio José Saraiva, o interesse historiográfico existe “porque a primeira obra que se escreveu em Portugal, a Crônica Geral de Espanha de 1344, é concebida, quanto ao seu núcleo, como séries genealógicas das principais famílias portuguesas.”. Sua importância histórica vai além do que se refere aos interesses da própria aristocracia - que eram relativos a heranças, cargos ou posições sociais, transmitidos hereditariamente-, pois com base nestas genealogias é possível delinear um histórico sobre os primeiros habitantes de Portugal, de onde vieram e, assim, concluir que tipo de influência exerceram na constituição da nação.

Para falarmos do Horto do Esposo, obra de cunho ascético e moral, teremos de voltar à questão religiosa do século XII e XIII, em Portugal e em outros países do Ocidente, momento em que a Igreja depara-se com a necessidade de reformar-se, para atingir todas as camadas sociais, passa, então, a difundir seus antigos dogmas de maneira acessível. O Horto do Esposo, escrito no final do século XIV, por autor anônimo, assume estes novos ideais, muitas vezes, perseguidos ao longo da Idade Média, pelos seguimentos mais ortodoxos da Igreja - não parece ser casual o fato de o autor não se identificar. O autor reúne contos tradicionais, narrando-os de maneira irônica e simples, com o objetivo de torná-los acessíveis, tanto aos nobres, quanto ao povo. Neste compêndio o autor não poupa ninguém, satiriza as mulheres, a falsa sabedoria, a cavalaria e a nobreza, a glória mundana e a própria Igreja.

Outra obra anônima e de caráter profundamente ascético e moral é o Boosco Deleitoso, datada do século XVI e voltada à doutrinação do homem social, nasce em um momento em que os ideais de doutrinação por parte da Igreja parecem terem sido alcançados, enquanto nos outros países da Europa está ocorrendo o advento da Reforma, em Portugal, as coisas parecem transcorrer pacificamente. A obra trata da viagem de um peregrino ao Boosco Deleitoso, os caminhos por que ele tem de passar são repletos de obstáculos, e para ultrapassá-los deve vencer a si mesmo, isto é, suas falhas espirituais, deve livrar seu espírito de tudo que possa ser considerado pecado pelas Santas Escrituras, quando alcança a pureza total de alma, é que chega ao Boosco Deleitoso. O peregrino representa o homem que busca a salvação, e que para alcançá-la deve desprender-se de todas as coisas materiais, pois não será em vida que alcançará a verdadeira felicidade. Depois de momentos tão tumultuados, a sociedade parecia querer paz, o que também é do interesse do clero e da monarquia, o Boosco Deleitoso traduz este sentimento. Este, também, será um cenário propício para a proliferação das hagiografias.

Neste mesmo século, começam a proliferar os compêndios hagiográficos em Portugal, entre eles o mais importante foi o Flos Santorum, tradução portuguesa da obra italiana Legenda Áurea, de Jacopo Varazze. As hagiografias do Flos Santorum foram se modificando no decorrer das reimpressões, o motivo era a preocupação da Igreja em banir elementos pagãos, que freqüentemente permeavam as histórias dos santos, - tudo que pudesse desviar os fiéis da ortodoxia cristã, era banido pela Igreja, que neste momento contava com o reforço da Inquisição, implantada por D. Manuel, com os objetivos de centralização do poder régio e do controle por parte da coroa -. Os objetivos das hagiografias eram divulgar a vida de santos, para que fossem imitadas pelos cristãos- por esta época eram comuns as peregrinações, divulgadas pelas ordens mendicantes. De acordo com Néri de Almeida Souza “No culto dos santos a cristianização encontrou o veículo ideal, pois foi capaz de atrair para o cristianismo um público ligado a valores religiosos tradicionais (...)”. “O século XVI vai constituir-se num marco na história de longa duração da santidade (...), o medo do Mal suplanta o abrigo certo alcançado junto aos santos e o heroísmo simbólico da unidade de grupos restritos cede ao individualismo heróico, institucional ou ideológico adotado pela história nos séculos seguintes.”.

Esperamos ter demonstrado, no decorrer da explanação, que as idéias e os valores presentes nas obras analisadas, datadas dos séculos XV e XVI, foram, efetivamente, herdadas das manifestações políticas, culturais e religiosas dos séculos XI, XII e XIII, manifestações comuns entre os países europeus em formação. As idéias e os valores foram resultantes dos desejos pela independência e pela sua estabilidade. Desde o início de cada nação as lutas pelo poder, entre as camadas mais altas e o clero, eram acirradas, daí resultam os valores expressos em obras como o Livro da Montaria, Leal Conselheiro e o Livro da Virtuosa Benfeitoria. A proliferação de ordens religiosas e de mosteiros na Idade Média Central, com o intuito de sedimentar o poder da Igreja, vão gerar valores presentes em todas as obras estudadas e com maior ênfase no Horto do Esposo, Boosco Deleitoso e o Flos Santorum. Para finalizar, podemos verificar, também, em todos os textos, a presença de idéias clássicas, cuja veiculação é intensificada nos séculos XII e XIII.


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O JORNAL E A TIPOLOGIA DISCURSIVA, artigo da professora Eleandra Lelli, publicado no livro: Redação e seu ensino, editora: Espaço Editorial

Este artigo visa a demonstrar como é possível estudar a diferença entre narração, descrição e dissertação de maneira diferenciada e dinâmica, utilizando o jornal impresso como recurso pedagógico.

A utilização de jornais e revistas em sala de aula não é uma idéia nova, mas ainda há uma certa relutância de ser colocada em prática, pois seria necessário um certo desvio do convencional livro didático, que continua sendo adotado, muitas vezes, como único recurso didático-pedagógico. Como sabemos, qualquer forma de mudança e inovação causa insegurança, principalmente, quando estas são propostas a profissionais já acomodados em suas práticas tradicionais, as quais, para os dias de hoje, não bastam. È preciso investir em diversificações e dinamismo para tornar as aulas mais produtivas e atraentes, não só para os alunos, como também para os professores.

As vantagens para o profissional que recorre ao auxílio da mídia impressa em geral são inúmeras, pois estará contribuindo para que seus alunos despertem para uma leitura mais ampla do mundo em que vivem, provocando-lhes, desde logo, o sentido da cidadania e, com isto, a compreensão de que podem e devem ser agentes sociais e culturais, capazes de contribuir para um mundo diferente.

Dito isto, partiremos, agora, para o desenvolvimento deste trabalho, cuja idéia surgiu de nossas experiências pessoais com alunos de ensino fundamental, médio e superior. Importante lembrar que cada nível de ensino requer um enfoque diferente, é preciso, também, avaliar os graus de conhecimento e dificuldades existentes nos alunos antes de qualquer trabalho.

1. O jornal e suas partes

Para a análise da tipologia discursiva, todos os cadernos de um jornal podem ser aproveitados, pois sempre há um exemplo de descrição, narração ou dissertação. Até mesmo nos classificados podemos utilizar as descrições dos objetos anunciados.

Não seria exagero aconselhar que antes de tudo os alunos sejam “apresentados ao jornal”, isto é, grande parte dos jovens não tem o hábito da leitura do jornal e, muito menos, intimidade com este veículo de informação. Claro que o conhece, mas não sabe, certamente, identificar suas partes, portanto não me parece perda de tempo ensiná-lo a manusear o jornal, a fim de facilitar o trabalho posterior. Tornando-se possível pedir para que abram no editorial ou em qualquer outro caderno e todos o farão simultaneamente, sem nenhum desconcerto ou inibição.

Visto isso, é possível partir para o passo seguinte: o reconhecimento de diferentes tipos de texto e de discurso no jornal.

2. A narração

O carro chefe do jornal é a notícia e nela está presente a narração, assim como na reportagem ou na crônica. Ao transmitir estes dados para o aluno, devemos explicar quais são os elementos da narração:

a. quem? (pessoas ou personagens envolvidas);

b. o quê ? (o fato ou acontecimento)

c. onde ? (local do acontecimento)

d. quando? (o momento em que aconteceu)

e. como ? ( de que modo)

f. por quê? (quais as causas)[1]

Localizar tais elementos em qualquer notícia ou reportagem será extremamente simples para qualquer aluno. Ficará fácil desvendar a essência do jornal: contar histórias reais. Saliente-se, porém, que histórias reais estão sujeitas a um certo grau de intencionalidade, por parte de quem escreve e da instituição a qual pertence. É imprescindível e enriquecedor para o aluno uma explanação sobre a necessidade de se ler uma notícia em mais de um veículo de informação, a fim de captar um possível viés[2] por parte do jornalista. E isto pode ser feito na própria sala de aula, desde que seja pedido para que tragam jornais diferentes.

Como proposta de redação, o aluno pode ser desafiado a construir uma notícia de jornal a partir de um fato ocorrido na própria sala de aula, na sua instituição de ensino ou a partir de um outro texto qualquer, utilizando-se da linguagem jornalística verificada nas notícias lidas, cujas normas são comumente: o emprego de uma linguagem simples; da ordem direta; da prevalência de verbos de ação e no perfeito; da forma concisa, clara e objetiva; porém sem o desvio da norma culta.

3. A descrição

A descrição é definida, por vários autores de manuais de redação, como sendo um retrato verbal de um objeto, personagem, ambiente; enfim, tudo que possa ser caracterizado por meio de adjetivos ou locuções adjetivas é rica em substantivos e verbos de ligação.

Já que os textos predominantemente descritivos se limitam aos classificados, o professor poderá explorar as descrições presentes de uma forma ou de outra nos diversos tipos de textos e discursos presentes no jornal, seja em notícias, crônicas, editoriais ou críticas.

Um bom exercício de produção textual seria pedir ao aluno que anunciasse algum objeto usado que pudesse interessar a alguém, enfatizando suas características positivas, de modo a atrair o interesse do leitor para a aquisição do que está sendo exposto para venda.

Ao analisar o texto descritivo no jornal, o professor poderá relembrar as modalidades da descrição:

- a descrição objetiva: que procura descrever com exatidão, com a preocupação de informar sem exageros ou juízos de valor;

- a descrição subjetiva: que parte das impressões pessoais do sujeito que narra;

- a descrição física e psicologia: que se referem às pessoas ou personagens, presentes nos textos jornalísticos de caráter narrativo.

As modalidades descritivas, vale acrescentar, podem aparecer conjuntamente num mesmo texto, porém, nos classificados, a objetiva é a que predomina, com a finalidade de transmitir maior credibilidade.

4. A dissertação

O discurso dissertativo será comum nos editoriais, críticas e resenhas. A dissertação consiste na defesa de uma idéia ou opinião por meio de argumentos, o que exige, por parte de quem escreve conhecimento sólido e amplo sobre o assunto tratado.

Analisando um texto dissertativo retirado do jornal, o aluno poderá perceber que o jornalista, em um editorial, por exemplo, expressa profundo conhecimento sobre aquilo que está dissertando, mesmo que o leitor não concorde com as opiniões expressas. Aliás o aluno precisa entender que a dissertação, antes de buscar convencer o leitor sobre suas posições, deve demonstrar que estas são válidas e respeitáveis, coisa que somente conseguirá se ao expressá-las, transmitir domínio e segurança sobre o assunto.

Os quesitos para uma boa dissertação são “análise das idéias, apreciação de prós e contras, estabelecimento da analogia, procura de causas e conseqüências”[3].

A estrutura da dissertação tem sido para muitos estudantes a parte mais complicada deste discurso, quando tratada apenas teoricamente. Temos observado que ao explicar a estrutura da dissertação por meio de exemplos, identificando em um texto já pronto cada uma de suas partes, o entendimento é alcançado mais fácil e rapidamente por parte dos alunos. Parece-nos que lhes falta a visualização do que está sendo exposto, por isso, mais uma vez, a utilização do jornal mostra-se extremamente eficiente. Certamente, a partir deste momento, o aluno apresentará maior facilidade ao ter de redigir sua dissertação.

Não basta, portanto, explicar, na sala de aula, o que se pode ler em qualquer manual de redação, que a dissertação deve possuir:

- introdução: que é a exposição do tema e qual posição assumirá sobre ele;

- desenvolvimento: exposição dos argumentos;

- conclusão: retomada da introdução ou recapitulação.

Se o aluno estiver embasado teoricamente e puder visualizar, concretamente, estes elementos, deixará de encarar a dissertação como algo tão complexo a ponto de não conseguir desenvolver uma.

O aluno poderá ser convidado a expor opinião contrária a de um determinado texto dissertativo, para exercitar o que aprendeu ou verificar se realmente aprendeu. Exercícios como identificar as partes estruturais da dissertação nos editoriais, por exemplo, são de grande valia.

5. A linguagem jornalística

Abriremos aqui um parêntesis para ressaltar que a redação moderna, em todas as profissões, requer uma linguagem que, além de obedecer às normas ditadas pela gramática normativa, seja concisa, coesa, coerente e objetiva em prol da clareza sobre o que se deseja transmitir. Todas essas características são encontradas nos textos de jornais sérios.

Parece-nos razoável, então, que os jornais façam parte do cotidiano das salas de aula, não só na disciplina de Língua Portuguesa, mas, nesse caso, principalmente nela.

De acordo com Maria Alice Faria, os jornais e revistas podem ser “mediadores entre a escola e o mundo” e em relação à linguagem jornalística defende que:

“Como padrão de língua”, os bons jornais oferecem, tanto ao professor como aos alunos, uma norma padrão escrita que sirva de ponto de referência para a correção na produção de textos. (...) Desenvolve e firma a capacidade leitora dos alunos; estimula a expressão escrita dos estudantes, que aprendem com o jornal a linguagem da comunicação para transmitirem suas próprias mensagens e informações”. [4]

Na linguagem jornalística podemos enfocar também o estudo das funções nela presentes, quais sejam, a referencial, a emotiva e a conativa.

6. Palavras finais

Para finalizar, gostaríamos de ressaltar que este artigo não visou a ensinar os colegas sobre quaisquer dos conceitos apontados, apenas almejou, despretensiosamente, partilhar de algumas experiências positivas em sala de aula, cuja utilização do jornal foi extremamente motivadora e eficaz.

São inumeráveis as possibilidades de trabalho e pesquisa que se podem alcançar com o jornal, que vão além dos tópicos específicos de nossa disciplina, pois o jornal ensina, dentre tantas coisas, a interdisciplinaridade.

Para os que estão iniciando no magistério, muitas vezes a teoria não supre as necessidades que a dinâmica da sala de aula impõe, por isso talvez esta nossa experiência seja interessante, não simplesmente para que seja reproduzida, mas principalmente a fim de que desperte novas idéias para novas experiências e assim sucessivamente.

Este trabalho foi escrito, acima de tudo, porque acreditamos que propostas de trabalho como esta podem trazer discussões e reflexões para a sala de aula, ampliando o senso crítico e a leitura de mundo de nossos alunos, assim como criando neles a intimidade com a leitura e conseqüentemente com a escrita.

BIBLIOGRAFIA:

BARBOSA, Severino Antonio M. e AMARAL, Emília. Escrever é desvendar o mundo.14ª ed., São Paulo: Papirus, 2001. 177p.

CITELLI, Adilson (org.). Outras linguagens na escola: publicidade, cinema e TV, rádio, jogos, informática.Coordenador Adilson Citelli. 2ª ed., São Paulo: Cortez, 2001. 253p

FARIA, M.Alice. Como usar o jornal na sala de aula.São Paulo: Contexto, 1996. 162p.

FIORIN, José Luiz e SAVIOLI, Francisco Platão. Para entender o texto: leitura e redação. 4ª ed., São Paulo: Ática, 2002 . 431p.

LUFT, Celso Pedro. Língua e liberdade. 8ª ed., São Paulo: Ática, 2002. 110p.

MEDEIROS, João Bosco. Comunicação escrita: a moderna prática da redação. São Paulo: Atlas, 1988. 279p.



[1] MEDEIROS, João Bosco. Comunicação escrita: a moderna prática da redação. São Paulo: Atlas, 1988. p. 191.

[2] Viés é definido como sendo a escolha de fatos e a ênfase atribuída a determinados tipos de pormenores. Em FIORIN, José Luiz e SAVIOLI, Francisco Platão. Para entender o texto: leitura e redação. 4ª ed., São Paulo: Ática, 2002 . p.251.

[3] MEDEIROS, João Bosco. Comunicação escrita: a moderna prática da redação. São Paulo: Atlas, 1988. p. 243.

[4] FARIA, M.Alice. Como usar o jornal na sala de aula.São Paulo: Contexto, 1996. p.p.11-12.